sábado, 27 de dezembro de 2014

Acaba, 2014! - a retrospectiva que não terminou


Que 68 que nada, o verdadeiro ano que não acabou foi 2014 (e ainda segue acontecendo, nesse plantãozinho que - para mim - só acaba amanhã no fim do dia).

Brincadeiras à parte, a impressão que eu tenho é que 2013 e 2014 são uma amálgama, irmãos siameses pré-cirurgia. E digo mais, acho até que 2013 começou naquele junho de manifestações e se arrastou até dezembro agora. A sequência dos fatos, todos eles intensos para o mundo, foi praticamente ininterrupta. Nós jornalistas sabemos bem desta intensidade.

Por isso acredito que aqueles adoráveis dias em Barra Grande não tiveram propriamente a função de réveillon. Acho que o que tive neste período de junho de 2013 para cá foram intervalos, que conto pelas viagens, porque é o que realmente vale a pena na vida.

Entre as manifestações de junho/julho/agosto (um acontecimento histórico e do qual eu sempre vou me lembrar com prazer por ter sido testemunha ocular), a longa-quase-interminável estadia do Papa Francisco e seus fiéis durante a JMJ no Rio (que aflorou meu mau humor da base aérea do Galeão às areias de Copacabana - só amenizado pelo fato de que cobri um evento com a presidente Dilma pela primeira vez) -,o Rock in Rio (divertido e delicioso de cobrir, mas não menos cansativo), a Bienal do Livro no Rio (que me proporcionou entrevistar mestre Zuenir Ventura, assistir a uma mesa-redonda com a bela e talentosa Clarice Niskier - de quem sou fã por 'A Alma Imoral', e bater um papo com Zeca Camargo sobre seu novo livro), ver a irreverência dos Pink Blocs durante a cobertura da Parada Gay na Praia de Copacabana, ir a São João da Barra ver a destruição culminada pela megalomania do sr. Eike Batista (tudo isso contando com a parceria do grande Edmar Mendes, motorista que me ajudou a encontrar cada lugar em S. João e que me salvou a pele de uma encrenca com os poderosos X), ver a derrubada da Perimetral e aguardar a promessa de novos tempos com o Porto Maravilha, as chuvas e mortes na Região Serrana e aquela tarde nada prazerosa no IML aguardando os corpos das vítimas, para enfim chegar na Bahia para a virada do ano.

O único break que tive pré-Bahia foi em julho quando, com folgas acumuladas da cobertura das manifestações, pude então ir a Paraty conferir a Flip e ver Bethânia com a professora Cleonice Berardinelli recitando Fernando Pessoa, apreciar Xico Sá de pertinho num bate-papo (antes dele ser morador oficial do Rio e eu poder compartilhar - não na mesma mesa - os botecos cariocas com o cronista).

Foi este o intervalo. Aí veio aquele charme baiano de Barra Grande na suposta virada, aquele pit stop em Itacaré e lá voltamos nós para as pautas de comportamento no Vidigal e a bater ponto nas delegacias da capital fluminense.

Fevereiro, antes da maratona no carnaval da Sapucaí, uma parada estratégica na Ilha Grande, terra da magia, onde a calmaria acontece e você conhece histórias incríveis de quem largou tudo - trabalho-casa-rotina-correria-vida-louca – para ir lá relaxar e contemplar a  beleza, o mar, a brisa.

E tome Sapucaí, quatro madrugadas de escolas de samba e muito trabalho. Mas não sem tietar Paulinho da Viola - tirar uma foto e postar no Instagram - o mestre do samba que eu só tinha assistido em shows no Circo, mas que pude então fazer uma perguntinha - nada genial, ali na dispersão, Portela já fora da avenida - mas já deu para ficar contente. Já estamos em março. E o pit stop dessa vez não é tão criativo. Eu, Mayté e Paula seguimos para dar um mergulho em Búzios, Arraial e Praia Seca (porque, diz o ditado, que o bom filho à casa torna).

Um pouco mais de trabalho, algumas delegacias e nenhum grande fato que tenha marcado a minha memória. Neste hiato, chega abril e as minhas desejadas férias. Partimos num quinteto pra Bolívia. Cruzamos o país de Evo, numa viagem de emoções afloradas. E, como não poderia deixar de ser, com quatro jornalistas e uma publicitária viajando, as notícias apareciam a todo tempo em nosso caminho.

Manifestações que interditaram a estrada - e lá vamos nós colocar as mochilas nas costas e andar até ultrapassar a barreira -, linchamento em praça pública e carro da polícia virado de cabeça pra baixo (na pacata cidade do Uyuni).

A recompensa veio em forma de deserto. Atravessar o Salar do Uyuni, sem dúvida o lugar mais lindo que já estive em toda a minha vida. Depois, chegamos na charmosa Copacabana e visitamos a Ilha do Sol. Ufa! Valeu a pena.

De volta ao Brasil, aquela inquietude, uma vontade imensa de não ficar mais ali, naquela cidade. Queria ir rodar o mundo, fazer como várias dessas pessoas que encontrei pela viagem, que estão por aí, peregrinando de lugar em lugar, sem data para voltar.

Entre uma pauta e outra, num fim de semana, fui ver BH. Terra do meu mineiro favorito.  Mercado municipal, o pôr-do-sol incrível do Mirante do Parque das Mangabeiras e, na volta, tome inquietude. A Copa se aproximava e eu não estava nem um pouco a fim de lidar com ela. Antes disso, um fato marcante: entrevistei o ídolo Glenn Greenwald, uma das poucas inspirações do jornalismo contemporâneo, que na ocasião lançava o seu livro 'Sem lugar para se esconder'. 

A Copa chegou, não teve jeito, e, junto com ela, chilenos, argentinos, colombianos, alguns europeus (aqueles alemães do quiosque do Leme, onde tive que cobrir a amarga derrota do Brasil0 e muita festa. Copacabana reviveu a JMJ, só que desta vez sem papa e sem peregrinos com mochilinhas em grandes cordões humanos. Muito trabalho, assistindo a diversão dos gringos, sem muito ânimo pra festa. A uma hora dessas eu já estava em um caso de amor com o Netflix, sem muita vontade de rua e etc. 

Terminada a Copa, um pit stop em São Paulo para dois dias de curso um de relax. Cheguei nesta terra, de onde vos falo agora, sem saber que dali a um mês estaria aqui morando. Vim desanimada, com um intuito de tomar um fôlego desta vida cansada - após a profusão de acontecimentos narrados, fora as mortes das personalidades que a minha memória já não me deixa lembrar as datas. Foi um misto de "tá, não vai ser agora" com "volte pro Rio com foco, faça planos, chega de só trabalhar, ir à praia e pro bar". E eu voltei assim. Fui ver a autoescola - que já havia começado e parado, e precisava tanto retomar -, cheguei a imprimir o DUDA e pensei "agora vai". Fiz contato com a professora de yoga, decidi que voltaria às aulas que a rotina intensa de trabalho mais a minha preguiça me fizeram abandonar. E, um dia antes de pagar o DUDA e então começar minha rotina de iogue, o telefone toca. Era o chefe de redação de São Paulo dizendo que aquela vaga tinha saído.

Se eu não poderia estar em SP na próxima segunda. Essa próxima segunda foram quatro semanas depois, após todos os ajustes necessários serem feitos.

Aqui chegando, consegui ir ver um festival de música e dar um relax em Paraty, voltar ao Rio - uma vez correndo para fazer mudança e a outra para enfim pegar uma praia -, e, por último visitar Ubatuba. Sigo em SP, desbravando essa terra há três meses e 13 dias e o ano ainda não acabou. Acho mesmo que eu preciso de um Ano Novo. Se possível, mais calmo e com mais pit stops por aí. Como diria o Roger: acaba, 2014!

Os prováveis últimos links do ano.

Mais um enviado por Palimpsesto - Eliane Brum sendo maravilhosamente Eliane Brum (nem sempre eu acho isso) - http://brasil.elpais.com/brasil/2014/12/22/opinion/1419251053_272392.html

Porque neste link dá para se apaixonar por ela, pela voz dela, pela letra e por este cavaquinho. http://www.youtube.com/watch?v=wdz28zNLRpo

Porque todos os dias que me bate a saudade eu ouço essa - mas só esta versão me agrada. http://www.youtube.com/watch?v=LKkjI5LdPiA

Não vejo a hora de chegar amanhã e poder gritar: http://www.youtube.com/watch?v=iEM1qEMyyP8



sábado, 20 de dezembro de 2014

Se eu puder, doces te darei

Se eu puder, flores lhe darei. Assim começa a canção "Sobre a Chuva", da minha amiga-cantora cantora-amiga Laura Zandonadi. (http://m.youtube.com/watch?v=3QAURYVHe10).

Não só primeiro verso da música é lindo, mas toda ela. Só que tivesse eu o direito da paródia cantaria Se eu puder, doces te darei...

Chocolates, paçocas, pirulitos. Felicidade em formato de comida. Ingestão de pequenas doses de doçura. Para suavizar, adocicar, deixar bonito o dia que temos pela frente.

Sempre encarei os doces como pequenas porções de alegria. Mas isso foi sempre tão normal e fez parte da minha vida que achei que fosse assim com todo mundo.

Essa semana fui surpreendida com gestos em formato de açúcar que me revelaram esta vocação pra formiga.

Mayte, a franco-carioca mais adorada do planeta, depois de uma temporada de dois meses passeando pelo Brasil passou aqui em SP na segunda-feira para se despedir antes de voltar pra sua terra. Chegou aqui cheia de histórias lindas de suas andanças pelo Nordeste e, depois, pelo Rio. Como ouvir e contar histórias está na mesma proporção dos doces em minha vida, fiquei muito feliz com a passagem dessa francesinha querida que ganhei de presente da Ilha Grande. E eis que na sua despedida, ela me deixa um saco de doces espanhóis e um bilhete fofo. Com açúcar, com afeto, fez meu dia mais feliz.

Ontem, minha mãe desembarcou na rodoviária do Tietê para antecipar comigo aquele Natal que estarei de plantão. Na bagagem, os presentinhos da vó, da tia. Todos eles apreciei e agradeci, mas nenhum me tocou mais do que o saquinho de doces da dinda querida, que tão bem entendeu o bem que as guloseimas me fazem.

*Porque lá fora é verão, mas aqui dentro <3 a="" href="https://www.youtube.com/watch?v=NrjzW3aoTvE&list=PLoV-P8GJeF0y_ZW9X86ZH06JDwLcUVVsD">https://www.youtube.com/watch?v=NrjzW3aoTvE&list=PLoV-P8GJeF0y_ZW9X86ZH06JDwLcUVVsD

** http://www1.folha.uol.com.br/colunas/ronaldolemos/2014/12/1562815-somos-todos-estagiarios.shtml

***Safatle sempre muito claro e objetivo. NÃO FORAM ANISTIADOS - http://www1.folha.uol.com.br/colunas/vladimirsafatle/2014/12/1562869-falsas-vitimas.shtml

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segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Respostas para Mariliz Pereira Jorge e Paula Bianca Bianchi

Abro a caixa de e-mail, como de de costume diário e no assunto me deparo com um "não é um grande texto". No corpo do e-mail, a sequência: "mas me identifiquei" e o link http://www1.folha.uol.com.br/colunas/marilizpereirajorge/2014/12/1560774-nao-sei-dizer-nao-para-a-vida.shtml.

A remetente, Palimpsesto, tem sempre o costume de me compartilhar os grandes, e eventualmente, os nem tão grandes assim.

É sempre bom. Alguns reflito, outros sinto. Os raros sinto-reflito / reflito-sinto.

Mas para este, me senti na obrigação emocional-racional cérebro-coração corpo-e-alma de responder.

Para a Mariliz Pereira Jorge. Ou diretamente para Paula Bianca Bianchi, repórtera-querida-que-compartilha-textos-bacanas.

Babe,
O texto é bacana e, se eu for pensar bem, reflete bastante a Isabela do Rio, bon vivant e amante de uma boa cerveja. Porém, ai, porém, sinalizou Paulinho da Viola tão bem em Foi um Rio que Passou em Minha Vida.

Não dizer não para a vida é lindo, sobretudo quando o que queremos é dizer para o mundo o quanto somos donos das nossas vidas, que pagamos nossas contas e saímos quando queremos,
sem dar satisfação para ninguém.

Até aí ok. Mas acho que dizer não, não quer dizer negar a vida. Dizer não pode ser apenas o cumprimento de um trato consigo mesmo. De se empenhar em ser bom em alguma coisa, ou apenas
prezar pelo seu bem-estar porque você quer acordar cedo no outro dia e cuidar do corpo ou apenas ir à praia.

Dizer não é difícil para burro, mas este ato está intimamente ligado à musculação da autoestima. Quanto mais malhamos a autoestima, mais aptos estaremos para dizer sim ou não quando queremos alguma coisa.

Dizer não para tudo é estar bitolado. Dizer não para algumas coisas é estar focado.
Dizer sim para algo é fruto de uma escolha. E, na maioria das vezes, produz bem-estar, se é exatamente aquilo o que você quer fazer.

Estar com os amigos, com birita ou sem birita, é uma delícia. Estar com eles porque você deseja isso é melhor ainda. Estar com eles porque você não quer dizer não ao social é triste.

Fazer escolhas é difícil pra caramba. E dizer não é fazer uma escolha. Não necessariamente uma negação. E toda a força para dizer não provém de uma insatisfação anterior. Vale sempre lembrar dela para combater a lassidão ou aprender a dizer não.

Por isso acho que o não tem sua função. Até mesmo para o sim ser escolhido como a melhor opção. Tem sido uma grande descoberta aprendê-lo. Quero sim(s) com mais paixão e, por isso,
tem sido bom aprender a importância do não.

Nesse mesmo ritmo, Gregorio falou quase o mesmo, só que de um modo mais intenso. Mas minha resposta também serve para ele. http://www1.folha.uol.com.br/colunas/gregorioduvivier/2014/12/1562358-sabado.shtml

E como meu lema de vida é "a música é a resposta", compartilho aqui Arrigo Barnabé, lindo de viver, que tive o prazer de assistir nesse sábado e que em outra ocasião comento essa grandiosidade musical. Ao lado dessa dupla porreta fez meu sábado ser grande. https://www.youtube.com/watch?v=Pk6rACa6mc0



sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Banksy e outros links


That's it!

Hoje é sexta e me permite ser breve.

1. Botando o carioqueixxx em ação pra dar essa dica pro Bom dia São Paulo: http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2014/12/exposicoes-sobre-arquiteta-lina-bo-bardi-terminam-neste-domingo-em-sp.html



2. Se eu tiver que trabalhar no carnaval e ficar por São Paulo, vai dar pra ser feliz com bloco de Caetano: http://vimeo.com/113515057

3. Orgulho master de ouvir que o teacher pra ganhar força não acreditava em mim, que achava que só ia durar duas semanas, e cá estou eu completando dois meses, quatro quilos a mais e serei a mais nova doadora de sangue, agora com 51 kg: http://www.prosangue.sp.gov.br/artigos/requisitos_basicos_para_doacao




De resto o que importa é que é um fim de semana sem trabalho. :D






quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Qual é o lide? e outros temas


A primeira vez que tive contato com essa frase foi na faculdade. O professor de Técnicas de Reportagem sempre contava uma historinha e perguntava pra turma:
"qual é o lide?". E lá íamos nós testar nosso senso de critério sobre o que é mais importante num fato. O que, onde, quando, porquê e, em determinados casos, quanto.
Era só o início do convívio diário com essas cinco palavrinhas/perguntinhas.

Depois, quando se é foca, ouve-se muito no começo: tá, mas qual é o lide? E, por fim, depois de alguns dias como foca você nunca mais ouve essa pergunta. Simplesmente porque o modo mais fofo como vão te sinalizar sobre isso é dizendo que o lide está no pé. Ou você aprende a se apressar em dizer o que é o lide ou está frito...

Passa-se o tempo e "qual é o lide, Pablo?" é sempre a pergunta feita pelos coleguinhas - que é como tratamos não-tão-carinhosamente-assim os companheiros de profissão. Após uma coletiva, um confere o lide do outro não só para saber se o senso de critério de todo mundo está em dia, mas principalmente para garantir que o chefe não pergunte depois porque cargas d´águas o veículo tal está publicando uma coisa e você está informando outra como a mais importante.

Mas nunca se ouve tanto "quero lides" quanto dos amigos jornalistas. Dos mais próximos, claro. E não, eles não querem saber se as aspas principais da Dilma são essas ou aquelas. Eles querem lides sobre as notícias da sua vida. Mas é diante desta ânsia por novidade que percebemos o quanto a gente se sente na obrigação de todo dia ter uma pauta, e se possível - que ela dê chamada na globo.com. Só que as nossas vidas não são jornais e não somos obrigados e ter novidades quentes diariamente, mesmo que a gente se sinta com esta necessidade.

Trabalhar com internet faz com que essa sede por novidade seja ainda maior. E ao trazer isso para nossas vidas, tendemos a uma grande frustração por não ter sempre um bom lide. Uma vida pode ser intensa - e acho isso ótimo - mas é perturbador pensar em ter que ter uma nova manchete a casa três horas.
Depois de pensar muito sobre isso, tem sido bom descobrir que é possível estabelecer uma rotina e não me sentir na obrigação em ganhar chamadas na home da minha vida. A audiência - aqui - não é uma necessidade, não se sobrevive dela.

Para repensar essas relações com lides ou chamadas da vida, exposição, frustrações, mundo editado, dores e delícias de sermos o que somos - caetaneando para não perder o costume - dei um tempo das redes, sobretudo do facebook. Trabalhar com isso, ficar pendurada muitas horas ali, me fez me sentir improdutiva e mexeu com muitas emoções. Vou aprender a lidar com isso melhor, enquanto isso não acontece, deixo aqui no blog a parte boa das redes que é compartilhar.
Para se encher de poesia/elucubrações -3 textos e um desenho - no blog do Dimi ou Diahum http://humdeabril.blogspot.com.br/

Ouvindo em looping essa canção que nos faz tanto pensar sobre as escolhas - dele, sempre dele, o mestre das profundezas, Raulzito https://www.youtube.com/watch?v=cvUG2kegI48

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Um samba ardente, harmonioso, buliçoso...

tivesse eu seguido meu sonho
teria me tornado sambista
mas por ter durante um tempo
mais lido do que ouvido
calhei de ser jornalista

++++++++++++++

o samba é a corda e eu sou a caçamba
disse Noel
ele é a tristeza que balança
a voz morro
o pai do prazer
e o filho da dor
disse Paulinho
que é alegria, falando coisas da gente
o dom de Wilson das Neves
na Terra de Dorival
todo mundo bole
e quem não gosta
bom sujeito não é
no Rio de Janeiro todo
mundo vai de samba,
a pedida é sempre samba
e eu também vou castigar
a minoria diz que não gosta mas gosta
e sofre muito quando vê alguém sambar
faz força, se domina, finge não estar
tomadinha pelo samba, louca pra sambar.

2 de dezembro, dia do samba.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Inveja do cigarro

Eu já tentei. Não tive sucesso. No dia seguinte a garganta ficava seca, na hora as mãos ficavam fedorentas e o tal prazer eu não encontrei. Não tinha muita habilidade, é verdade. Hoje fico incomodada se alguém lança uma baforada na minha cara. E não há nada no mundo que tire mais o meu humor - além de acordar cedo - como sentir a fumaça de alguém fumando pela manhã do meu lado. Não sei se esse lance de ser de manhã é psicológico ou porque ainda estou de mau humor por ser antes do meio-dia.

Mas o fato é que mesmo com todas essas ressalvas que fiz questão de antecipar, não posso negar: tenho uma inveja descomunal de quem fuma.

É evidente que eu sei de todos os malefícios e já perdi um avô e um tio com câncer de pulmão. Mas o cerne de minha inveja é tocado quando ouço um:"vou ali embaixo dar uma relaxada e fumar um cigarrinho".

Acho de uma beleza sem igual quando alguém se dá aquele prazer no meio do dia, do trabalho ou de qualquer outra atividade.

Parece que nada é mais importante do que seu próprio prazer.

Tudo pode esperar. Nada é tão urgente que não possa aguardar que eu vá ali, dê um trago e volte ao ofício.

Acho lindo. De uma poesia infinita.

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Bolhas de sabão


sonhei que era criança e
então me perguntavam:
qual vai ser sua profissão?
no que respondi:
serei mestre em bolhas de sabão
bolhas de sabão? -
questionou indignado o rapaz
bolhas de sabão, sim senhor.
viajarei de praça em praça
e terei como missão
espalhar por todo o mundo
milhões de bolhas de sabão.

quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Tudo que não invento é falso

"A poesia está guardada nas palavras – é tudo que eu sei.
Meu fado é o de não saber quase tudo.
Sobre o nada eu tenho profundidades.
Não tenho conexões com a realidade.

Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro.
Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas).
Por essa pequena sentença me elogiaram de imbecil.
Fiquei emocionado. Sou fraco para elogios.". Manoel de Barros

O grande poeta das miudezas e pequenas coisas partiu hoje, mas deixou muitas insignificâncias para tornarem o nosso viver mais rico e interessante. Manoel falou desde a incompletude do homem até sobre formigas, árvores e miudezas em geral.

"Só dez por cento é mentira", um dos melhores documentários que já assisti sobre alguém que ainda estivesse vivo, é de uma delicadeza sem fim. Mostra Manoel na sua função de operário das palavras, ali, na simplicidade de quem busca apenas o prazer em transformar o mundo em poesia. Exercitando diariamente o contato com a palavra, como em qualquer trabalho burocrático. A diferença entre as duas "burocracias" é que Manoel só se importava com aquilo que é considerado insignificante. Aí está o grande barato de sua poesia.

"A maior riqueza do homem
é a sua incompletude.
Nesse ponto sou abastado.
Palavras que me aceitam como
sou - eu não aceito.
Não aguento ser apenas um
sujeito que abre
portas, que puxa válvulas,
que olha o relógio, que
compra pão às 6 horas da tarde,
que vai lá fora,
que aponta lápis,
que vê a uva etc. etc.
Perdoai
Mas eu preciso ser Outros.
Eu penso renovar o homem
usando borboletas"

Esse é de uma lindeza sem fim. Não podemos lamentar. Foram 97 anos de vida, mais de sete décadas de dedicação à palavra. Deixou para gente uma obra vasta, um alento para cada dia.

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Dia de Fúria

Que atire a primeira pedra quem nunca teve um Dia de Fúria. Assim, com maiúsculas, por que quando acontecem são uma espécie de entidade. São nesses dias em que você é colocado à prova, sabe-se lá por quem - pelo universo ou pela sociedade fazendo pegadinha - seu humor e capacidade de viver coletivamente são testados.

Recentemente vivi alguns desses. Faz parte da adaptação em uma cidade enorme cujas longas distâncias aliadas ao desconhecimento do espaço dá uma desesperada. Principalmente quando você precisa cumprir horários. Justamente por estar vivendo essa etapa agora é que me identifiquei tanto com Relatos Selvagens, em cartaz nos cinemas.

Sobretudo com o Dia de Fúria do personagem de Ricardo Darín, que tendo que atender tantas demandas de trabalho e família é pego pela indústria de multas da prefeitura, tem o carro rebocado e se vê diante de uma burocracia sem fim para conseguir buscar o automóvel. Tudo isso no aniversário de sua filha, que aguarda o bolo que ele ficou de levar para cantar parabéns. O que acontece depois? Vale a pena conferir.

O lance é que ele acaba preso por perder o autocontrole em uma situação que poderia ser banal caso não tivesse acontecido em um dia de fúria e a paciência do personagem em questão já tinha ultrapassado o limite.

E é justamente nessas situações-limite que nossos piores sentimentos vêm à tona. Explico: eu muitas vezes já morri de vontade de andar com pedrinhas no bolso para atirar nos ônibus que ignoram o meu sinal. É evidente que eu não vou fazer isso porque eu não quero machucar ninguém e, muito menos, ser presa. Mas não posso mentir, a vontade vem e vem grande.

É uma linha muito tênue a de manter o controle e aguentar o tranco e surtar e virar o Bombita, personagem de Darín. Uma luta diária eu diria. Ainda bem que existe música e a gente liga o aplicativo no telefone e a fúria passa.

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Caro (a) leitor (a)

Bons, velhos, raros, porém assíduos. Esses são os leitores que me acompanham nessas linhas truncadas, às vezes tão pouco explicativas, em outras, apenas em caráter de desabafo. Não faz mal, meu compromisso aqui é não ter compromisso. Escrevo quando quero, da maneira que quero, vez por outra com erros que só vou me tocar meses depois quando resolvo enfim revisar o que parei pra escrever. Aqui não me levo a sério, não me cobro e não tenho que explicar nada pra ninguém. Nem sobre forma, tampouco conteúdo. É apenas exercício da escrita por ele mesmo.

Visto que sou uma metamorfose ambulante e que escrevo aqui desde 2011 (!!!!!) - ainda que por muito tempo com textos esporádicos - me preocupo quando a curva do Google analytics me informa que em uma única hora tive um pico de 44 acessos vindos de um único leitor. Para ser sincera, me assusta um pouco.

Quem seria esta criatura que gastou sua hora para ler meus rabiscos nesta página online? Esta é a primeira indagação. Se você está aí, me lendo agora - ou talvez o leitor em questão tenha caído aqui indicado pelo nosso oráculo contemporâneo, tenha gasto sua hora e nunca mais volte aqui - digo, caro leitor, que você pode ter verificado a profusão de abobrinhas as quais me dediquei ao longo desses últimos três anos. Por isso peço compaixão com uma bobagem ou outra que aqui eu tenha escrito.

No mais, fico orgulhosa das minhas bobagens. Justamente por não ter que me levar a sério, por ter a oportunidade da informalidade e do descompromisso, é que prezo tanto esse espaço pra escrever quando me der na telha.

Sabendo que você, no ímpeto de ler essas palavras, se esforçou para manter-se em frente à tela - do seu computador, tablet ou smartphone - agradeço pela paciência e peço que, assim como eu, não leve tão a sério o conteúdo deste blog.

terça-feira, 4 de novembro de 2014

O dia em que peguei o elevador com Jô Soares

Hoje eu peguei o elevador com o Jô. Eu voltava do lanche, apertei o botão distraída, entrei e levei alguns segundos para cair a ficha.
Aquele que foi um dos comediantes com maior repercussão no país e atualmente entrevista as nossas maiores personalidades estava ali, na minha frente, impecável com seu terno, pronto para gravar seu programa.
Mas não havia naquele baixinho (sim, ele tem a estatura mais baixa que a minha) aquela alegria de sempre.
Jô falava com uma mulher, creio eu que seja alguém da sua produção, e estava com os olhos cheios d´água.
Na hora me lembrei da perda do seu filho na última sexta-feira.
O tom solene que havia no elevador me fez baixar a cabeça e não dizer nada.
Mas a sua irreverência me impressionou.
Como se não quisesse que eu fosse embora com aquela impressão de sua tristeza, puxou assunto:
- Está bom esse suco?
- Está ótimo - eu disse - é de melancia, você quer?
- Não, obrigada, acabei de tomar um suco de melão enorme agora.
- Estava bom?
- Estava ótimo! Opa, chegamos. Vocês seguem?
- Vamos seguir.

Só sei que foi assim.
Um pouco depois, dei uma busca e achei esse vídeo. Não preciso discorrer sobre. Tem emoção suficiente para quem é de se emocionar.

http://globotv.globo.com/rede-globo/programa-do-jo/v/jo-abre-o-programa-de-forma-diferente-e-faz-uma-homenagem-ao-filho-rafael/3740735/

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Na fila da lanchonete

Suspirava eu na fila da lanchonete da firma por algum motivo que já nem vem ao caso. Foi quando uma criatura que sequer vi na vida se intrometeu no meu suspiro e falou:
- Não fique triste não que daqui a quatro anos melhora.
No que retruquei:
- Ah, mas eu nem to triste por isso. Pelo contrário, to bem feliz.
- Então você também votou na Dilma, está entre eles.
- Infelizmente não. Tive que justificar, mas queria ter me juntado à massa funkeira.
Percebendo meu sotaque, ele disparou.
- O Rio de Janeiro votou nela.
- Sim, estou orgulhosa dos meus conterrâneos.
- Aqui a gente odeia ela.
Pensei em oferecer um cartão de um analista pra ele ir pensar no ódio dele. Ou em alfinetá-lo com o Alckmin e a falta d´água, mas apenas respondi.
- Nem tanto.
E fui embora com meu pão de queijo porque eu não sou obrigada.

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Lívia tinha razão

Lá pelos idos do fim de maio, início de junho, eu estava um pouco mal-humorada com a chegada da Copa do Mundo ao país.

Além de não ser tão inteirada dos assuntos futebolísticos, nem de me empolgar com as seleções em campo, me chateava o fato de ter que trabalhar diretamente com isso.

Lamentei em voz alta e a amiga Lívia Torres, então colega de trabalho e amante do esporte, me alertou dizendo algo do tipo:

- Nas eleições será muito pior. A Copa pelo menos é divertida, a cidade fica animada.
Eu rebati que era legal, que as eleições eram o meu futebol, porque o debate sobre o país esquentava e você poderia contar com discussões interessantes.

Pois bem: durante a Copa, driblei meu mau humor; consegui ver de longe o clima de festa que o mundial instaurou no Rio, já que o cansaço com a labuta não me deixou aproveitar tanto.
Mas foi possível sentir o clima de comunhão entre as pessoas, engajadas pelas suas seleções ou - ainda mais - pela paquera intermundial que tomou conta da Praia de Copacabana.

Já nas eleições presidenciais, o debate mesmo - sobretudo no segundo turno - foi pro beleléu.
Para além de uma luta de classes, tivemos que lidar com uma profusão de notícias falsas replicadas no Facebook, guerras toscas com palavras de ordem como ForaPtralhas e ódio cada vez mais pululante, de ofensas virtuais à porrada com bandeiras hoje no Centro de SP.

Sabemos dos problemas do governo PT - embora eu ache que a linha de pensamento seja a melhor entre as duas oferecidas atualmente para o país e, por isso, #VotoDilma13.

Podemos, criticamente, cobrar uma postura mais à esquerda do partido caso ele vença o pleito.

Tenho - particularmente- um certo asco à figura do Aécio Neves - não só como homem político, mas como homem apenas - e me falta empatia com a proposta de governo excludente do PSDB.

Minhas convicções não são e nunca serão inabaláveis porque acho que temos de estar sempre atentos e de ouvidos abertos ao que mundo está dizendo/gritando.

Por isso tento ouvir o que cada um tem a dizer e, se for possível e a outra pessoa estiver disponível, argumentar.

Mas o que tenho visto aqui e no mundo real é pouca disponibilidade para ouvir, discursos prontos e "inabaláveis".

A minha única alegria nessa eleição foi ver que uma criatura inteligente e com propostas soube amarrar suas ideias e apresentá-las de maneira brilhante nos debates.

Tarcísio Motta surpreendeu - quebrou o tabu de muitas pessoas que não votavam no PSOL fossem quais fossem os seus preconceitos - e atingiu quase 10% de votação.

Fora isso, tudo muito pouco interessante. Repetições de papagaio, gritos sem propósito, palavras de ordem impensadas.

É, Lívia Torres, dou o braço a torcer e digo que você tinha razão.

Mesmo com aquele amargo 7x1 de junho e os alemães sapateando na nossa cara com aqueles baldes de cerveja no Leme, a Copa foi mais interessante.

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Um mês de paulicéia

Hoje tem um mês que cheguei aqui, nessa paulicéia desvairada - aquela, de Mário de Andrade.

O que mais perguntam? O porque deu ter largado o Rio, a beleza natural e, sobretudo, a praia.

Olha, eu queria dizer que eu não abandonei o purgatório da beleza e do caos em vão.

Não, não foi desamor. Nem trabalho, nem grana, nem reclamação porque está tudo caro no Rio, tampouco porque os serviços estão péssimos.

Está tudo assim mesmo, é verdade. Mas nada disso seria motivo suficiente para largar o lifestyle carioca.

A bike e o skate na volta do trabalho fazem muita falta. Os vinte minutos de ida até lá de ônibus também.

Sim, agora eu levo 45 minutos para chegar no trampo, como os paulistas gostam de chamar a labuta.

Também não tenho mais a magrela, nem o skatinho.

O samba na pedra e a praia na quarta-feira também não.

O lance é o seguinte: vez em quando a gente precisa de uma mudança radical, uma troca efetiva de hábitos.

Em bom português, precisamos crescer.

E para mim, essa mudança de cenário foi necessária para que eu possa, num futuro - que eu espero sinceramente - breve, mudar esses hábitos e ficar orgulhosa de mim mesma.

É difícil, e eu posso garantir, sem vergonha alguma, que um mês depois, eu pouco mudei.

Os velhos hábitos permanecem, embora eu já esteja me esforçando para mudá-los.

Quero que seja uma escolha vitoriosa, e tento me lembrar disso todos os dias.

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Rio é ex, SP é flerte

Aterrissando no Galeão já bateu aquele arroubo. Comparo a sensação com a seguinte: você termina um namoro que não estava bom por algum motivo e, três semanas depois, você reencontra a dita cuja ou o dito cujo e sente uma saudade absurda. Tudo o que você quer fazer é matar a saudade. O resto pouco importa. Todos os problemas você esquece naquele momento.

Foi mais ou menos assim que me senti quando cheguei ao Rio depois de três semanas em São Paulo. Pensando bem, eu entendi o porque.   São Paulo ainda não é um namoro. É um flerte. Estamos nos conhecendo, nos apresentando. E é normal pensar na/no ex enquanto ainda não se tenha apaixonado de novo. Vai ver é isso. Não matei toda a saudade que tinha, mas estou aqui, de volta ao flerte, ansiosa para que a paixão aconteça logo.

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Chuva, apelidos, cultura, filas e domingos cheios


Chuva, suor e cerveja - como aquela música de Caetano - são coisas do passado. Talvez a chuva fosse ainda mais até sexta-feira, quando finalmente a garoa - e que garoa!! - deu o ar da graça na terra cuja alcunha lhe toma emprestada.

Quem aparece por aqui sem muita cerimônia são os apelidos de primeira sílaba. Há quem pergunte se eu prefiro que me chamem de Isa ou de Bela ou até de um terceiro apelido. Mas no fim das contas, todos optam pela primeira sílaba. Comigo e com todo mundo. Não tome como pessoal. Acho carinhoso.

Um hábito marcante nesta pauliceia é o consumo de cultura. Consome-se muito. E é bonito de se ver. Os pais levam suas crianças para o que - a priori - pode parecer um programa de adulto. O mais divertido nisso tudo é ouvir os comentários sinceros dos pequenos.  Na Feito por brasileiros, no Hospital Matarazzo, observei um menino, ele deveria ter uns cinco anos - vendo um vídeo. Ele assistiu pela primeira vez, ficou na sala e viu novamente. Estava pronto para ver pela terceira vez quando o pai o chamou. Ele disse "tudo bem, vamos ver outra coisa, mas, mãe, eu não gostei desse vídeo". O tape se tratava de várias pessoas jogando vasos de plantas no pátio externo do hospital. Os vasos quebrados nós podíamos ver logo que saíamos da sala. Eu e o jovem menino concordamos. Péssimo gosto.

Outro ponto que não se pode deixar de mencionar é a quantidade de filas e como gostam de ficar nelas. Para comprar um doce na nova loja da Nutella, para o próprio consumo de cultura e outros motivos que ainda vou descobrir. Acho que não é uma exclusividade daqui, mas é algo notório.

Mas o melhor guardei para o final. Passear pela Avenida Paulista aos domingos é quando se vê que há vida neste dia tão renegado pelas cidades mundo afora ou Brasil adentro. Sempre achei deprimentes os domingos televisivos em que não se vive a cidade. Nisso fui imensamente feliz no Rio. Os domingos foram plenamente vividos. E é gostoso demais ver que mesmo quando eles são cinzas por aqui, também são apreciados pelas pessoas que enchem as ruas.

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Gregorio tem razão

Fez alarde nas últimas semanas as colunas de Gregorio Duvivier sobre São Paulo. O burburinho foi grande e as palavras do carioca reverberaram em outra coluna - a de Tati Bernardi.

O fato é que hoje, quando completo 10 dias na Terra da Garoa, onde garoa mesmo vi pouca ou quase nenhuma, dá para concordar com o colunista em algumas coisas.

A primeira delas é a dificuldade do paulistano - ou de quem mora aqui há tantos anos - em receber um elogio. Mas além disso. Parece inconcebível para a maioria dos residentes da selva de pedra alguém trocar o Rio por São Paulo.

"Mas veio porque? Tem família aqui?", é a pergunta que mais ouvi até então.

Ou uma variação do "mas veio porque?", acompanhada de um outro motivo.

"Po, mas abandonou a praia?"; "O Rio é tão gostoso" e outros clássicos como esses também ouço.

Entre as grandes piadas que encontrei aqui a maior delas foi justamente a de não ter garoa. Hoje, por exemplo, o clima estava seco de arder os olhos.

Mas eu sigo encontrando paulistanos e forasteiros - sempre eles - muitos gentis por aqui. E isso tem sido ótimo.

Uma estranheza: o milho verde que as pessoas comem num pratinho com colherzinha. Achei uma civilização excessiva, exacerbada eu diria. Lamentei pelo milho, aquele do fim de tarde na praia, que a gente come segurando com as mãos e, danem-se os dentes que ficarem com pedacinhos agarrados. Mas, milho verde e perguntas esdrúxulas à parte, acho que essa paquera com Essepê ainda pode se tornar um belo namoro.

sábado, 20 de setembro de 2014

Sobre esse lance de não existir amor em SP

Olha, pode até ser leviano de minha parte querer discorrer sobre a máxima de Criolo com tão pouco tempo de vivência in loco. Mas se de fato não existe amor em SP - ainda vou descobrir - posso dizer que há muita gentileza na rua.

Num mesmo dia em que quis experimentar fazer o trajeto de casa até o trabalho de ônibus - e não de metrô como havia fazendo - encontrei delicadeza na ida e na volta.

Para ir, me preocupei se tinha o número certo da condução e comecei a perguntar no ponto. Ao que um rapaz simpático me disse que pegaria aquele ônibus, que eu não me preocupasse porque em cinco minutos ele passaria ali. Perguntou para onde eu iria e me disse quanto tempo eu levaria para chegar até lá. Uma senhora - de cabelos brancos assumidos e nem por isso sem perder a aparência jovial - cochichou no meu ouvido que o rapaz era uma graça e -vejam só - combinava comigo! Ri um riso amarelo e pensei cá com os meus botões na pataquada que acabara de ouvir, mas achei fofa a tentativa de cupido da jovem senhora.

Já na volta, aguardava o mesmo ônibus em um ponto sem muita iluminação. Eis que um casal de rapazes passa por mim e um deles me diz que não era bom eu ficar sozinha ali e que, pronto, tinham decidido, iriam comigo até o ponto mais iluminado da rua e depois voltariam para a lanchonete onde desejavam comer. E assim o fizeram.

Uma outra coisa me chamou a atenção. As pessoas aqui se desculpam por gestos que - é, realmente, a gente deveria se desculpar por eles - não é normal fazê-lo. Ontem mesmo uma moça que mora aqui no prédio se desculpou por não ter segurado a porta do elevador para mim porque não tinha me visto chegar.

À parte o fato de que fui gentilmente recebida por dois amigos queridos em sua casa desde que cheguei à terra da garoa e, desde então busco um lar, só encontro mais razões para achar que pode sim existir amor em SP. 


terça-feira, 9 de setembro de 2014

Trabalhando a poesia parte 1

Não ignore minha saudade
Porque nela não tem dor
Só calor

É quando deixo esse cartão-postal
Que percebo a vida-cor

Sofrimento a gente adia,
Sentimento não tem dia
E não existe geografia
Onde a saudade não está

Não ignore minha saudade
Porque vou morar no cinza
E sem a pedra e sem a tinta
Eu vou aprender a amar

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Não se vive sem trilha sonora

Faz um tempo. Não me lembro quanto. Só sei que foi num desses dias em que se chega sorridente e cantarolando - a canção eu poderia chutar que era do Chico ou de algum outro romântico, não sei precisar qual - e respondi ao interlocutor que me indagava o porquê da cantoria àquela hora do dia.

"Não se vive uma paixão sem trilha sonora", eu disse entre o refrão, abrir a porta do elevador e subir terminando os outros versos da canção. Foi uma dessas respostas categóricas que gosto de dar, sempre com um sorriso finalizando a frase. Quase como se tivesse terminado a fala com um "obrigada pela pergunta".

Ela me cabia naquele momento perfeitamente. Mas a verdade, acordei com mais certeza hoje, é que não se vive sem trilha sonora e ponto. Para o amor - e também ao desamor - há sempre uma música pro coração.

Tem as de angústia, as de esperança, as de alegria gratuita, as solenes, as dançantes e as que fazem chorar tamanha a força com que nos tocam. Há sempre a chance de encontrar uma canção que diga exatamente o que você está sentindo naquele exato momento.

Também existem aquelas que você sempre ouviu com determinado cantor e nunca deu a menor bola. Até que vem alguém, tipo Bethânia em Pra Rua Me Levar, e te faz mudar completamente de ideia sobre aquela canção.

Sempre que possível repito para alguém que "a formiga só trabalha porque não sabe cantar". Uma espécie de protesto ao meu desafino, baseada em Raul. Mas certa vez me responderam: "ouvir também é uma arte". Então sigo ouvindo.

domingo, 24 de agosto de 2014

É que Marte estava em Libra...

"Porque eu sou tímido e teve um negócio de você perguntar o meu signo, quando não havia signo nenhum. Escorpião, sagitário, não sei que lá. Ficou um papo de otário, um papo. Ia sendo bom...", cantava Gal lindamente no auge de sua juventude.

Papo de otário ou não, os astros são sim "Da Maior Importância", tal qual o nome da música, de pertinência sem igual. E é sobre eles que discorro agora. Houve um momento em que mercúrio retrógrado era o novo preto. E havia razão de ser. Só neste ano ele já retrocedeu duas vezes e - segurem as pontas aí que - tem mais um movimento desses em outubro.

O planeta, que rege a comunicação, saiu das páginas de Susan Miller para as de O Globo e toda a sorte de revistas que traziam previsões astrológicas para o tal 2014 (no ano passado ele também já bombava nas colunas dos jornais).

Mas o fato é que este ano um tal de Marte roubou a cena. Entre muitas conversas entre amigos e amigas, houve um consenso geral de que este ano acabou de começar. Há quem diga que ele só começou em agosto. Eu prefiro achar que foi no fim de julho, quando Marte deixou libra - depois de oito meses - e entrou em Escorpião. Ali começava o então aguardado 2014. Natural que as coisas só aconteçam em agosto, já que elas demoram a pegar no tranco.

Esse negócio de ser otário ainda vai nos levar além (tudo bem que Leminski disse que era de ser exatamente quem a gente é, mas pego minha licença, nada poética mais para otária, e escrevo assim).

Entrevistava uma cantora que me falava de seu disco novo e de como estava difícil dele sair, com vários perrengues no caminho. Não me contive e lancei. "Relaxa, é que Marte estava em libra...Ele já entrou em escorpião, vai ficar tudo bem". E dali o papo descambou para astrologia até que retornássemos ao assunto importante: música.

Para ela tudo fez sentido. Para mim era apenas uma repetição de um mantra de que ficaria tudo bem, eu sabia, Marte tinha deixado libra e não era possível que nada ainda tinha acontecido até ali. Iria acontecer.

E aconteceu. Ufa. Aconteceu. Marte provou para mim que tinha entrado em escorpião e que o ano enfim andaria. Dias depois, respirei fundo aliviada. Sorri. E depois achei graça. Lembrei que reencontrei uma amiga muito querida e conversa vai, conversa vem, eu disse que era cética. Eis que ela me interrompeu e perguntou: "Cética? Quem lê Susan Miller não é cética". Eu gargalhei.

É verdade. Gosto mesmo de acreditar nessas bobagens. Ou, como cantarolava Gal, ficar num papo de otário. Mas isso é da menor importância, da maior importância mesmo é que Marte mudou de posição e fez a vida funcionar. Viva Marte.

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

De mar, de sol, de lua

Um casal de amigos gringos, recém-pousado no Rio, me pergunta se gosto de morar no meu prédio. Respondo orgulhosa que sim, ainda mais porque da janela da sala vê-se a Pedra da Gávea e temos uma posição privilegiada para o Cristo.

A mulher ri e pergunta se sou religiosa quase que num sarcasmo de quem sabe que a resposta é não. Ao mesmo tempo que digo que não sou - com um sorriso no rosto de quem confessa o contraditório - ela emenda que o carioca tem uma devoção por esta imagem tal qual um prêmio que exibe na estante. Não discordei. E foi a deixa para eu tecer praticamente uma declaração de amor pelo purgatório da beleza e do caos ali, naquela mesa de bar.

Foi dessa conversa que me lembrei quando hoje fui pega com a real e concreta possibilidade de deixar a cidade. É um desejo que existe há algum tempo, é verdade. Mas só quando ele está próximo de se realizar é que o frio na barriga invade todo o seu corpo e você passa a olhar para cada detalhe ao seu redor como se estivesse se despedindo.

Foram sete anos e meio de pura paixão, que antes de sê-la era um sonho. Primeiro um sonho longínquo de uma adolescente que queria ir ver o mundo e toda a sua liberdade. E o mundo estava ali, a 150 km de distância. Depois um sonho vivo, que se concretizou e que - cá para nós -, vivi intensamente.

Os banhos de mar, de sol e de lua. Porque não se passa um verão nesta safada sem um mergulho noturno no Arpoador. As ciclovias do Aterro, da orla e da Lagoa que cruzei sempre admirando a geografia mais bela do planeta (sim, porque nós cariocas, visto que já me tornei uma, temos essa mania de dizer que tudo nosso é mais; como dizem que a esfirra do Largo do Machado é a melhor da cidade e o pessoal do Humaitá certamente acha que a da Cobal é que é).

Cada boteco, cada noite interminável na querida São Salvador, cada ida à praia esticada em um samba na Pedra com pés cheios de areia e cabelos despenteados e duros de sal. Aquela eterna reclamação de que "isso é uma província, é um absurdo às 2h não ter mais bar aberto para a gente beber". Tudo isso marca o espírito dessa cidade, que no meu ponto de vista só deveria ser habitada por bon vivants, afinal de contas é muita beleza e talento para ser feliz concentrados num lugar só. "Absurdo mesmo é ver TV nesse(a) - prefiro usar no feminino - Rio de Janeiro", foi o que pensei deslumbrada quando aqui cheguei.

E por muitos anos não vi mesmo. O encantamento com as mil possibilidades só me fazia querer saber e descobrir cada canto desse lugar. O fato é que você pode ser bon vivant de qualquer maneira nesta cidade. Acordando cedo para fazer a Trilha da Urca ou indo dormir às 6 depois de uma noite irada em Santa Teresa. E isso aprendi bem com os cariocas. Viver como se não houvesse amanhã. Se para ser convidada para ir à casa de alguém é melhor ter amigos forasteiros na cidade, no quesito carpe diem o carioca não se acanha em ser seu "brother".

Os defeitos, ah, eles a gente aprende a aceitá-los, como fazemos com o que ou quem amamos. Mas tudo que é arrebatador não nos sai da memória. Quero um novo mundo de possibilidades, porém sem esquecer essa grande paixão. Rio, você é e sempre será a mulher que mais amei. Obrigada por tudo e até a próxima.

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Sonho de vida

Na próxima vida
Quero vir bon vivant
Ir dormir de manhã
Junto com os violeiros
Ou apenas baderneiros
Aqueles comprometidos
Apenas com o prazer de viver

segunda-feira, 2 de junho de 2014

Dalí e a abertura da gaiolinha



Para Amir Haddad – o criador do Tá na Rua e um dos pioneiros do teatro de rua como ele é feito atualmente – o lance é lubrificar a periquita. Ou qualquer nome que você goste de dar para o órgão sexual feminino. Para Freud talvez o gancho fosse dar um tiro imaginário no superego. Para um grande amigo meu, o negócio é abrir a gaiolinha que todos nós temos dentro da nossa cabeça.
Eu gosto dessa ideia de destrancar a gaiolinha, é quase como o objetivo de botar um óleo na frigideira que dá alcunha a este blog. É inquietante essa gaiola, às vezes sinto que minha criatividade está toda presa ali como um pássaro que pede pelamordedeus pra sair.  E essa angústia se acentuou ao ver Dalí – o de lá da Catalunha – de perto.
Ao ver a exposição que leva o nome do artista catalão no CCBB, senti pulsar essa vontade de escancarar a gaiola. Explico: me tranquilizou o fato de ver que mesmo  Dalí – aquele gênio que fez parte do surrealismo, que conseguiu pintar tão bem a questão do tempo, que se imortalizou com seus relógios derretidos e nos faz lembrar dele quase 25 anos depois de sua morte – teve sua gaiola fechada.
Ver obras comuns – e embora dizer que são comuns possa parecer arrogante de minha parte– é animador. Ver Dalí pintando um caminho qualquer com árvores ou fazendo retratos do seu pai dá uma esperança de que mesmo com textos ruins hoje, um dia eu possa extravasar de uma forma mais libertária e com mais loucura tudo o que me passa pela cabeça.
Em uma parede com capas de revistas nas quais Dalí aparece, é perceptível esse pulo do gato em sua irreverência e liberdade. Mais novo, é possível ver um olhar ainda ingênuo e pouco louco. Anos depois fica nítida a maneira como se jogou na pintura a ponto de executar tão bem o surrealismo.
É um alento, uma esperança boa – mais que isso -, um estímulo.

Texto e fotos da exposição que fiz para o G1.

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Olho Nu ou um tapa na covardia



Ney Matogrosso é uma tapa na covardia, um desafio ao status quo, um frescor no meio de tanta caretice que povoa o mundo. Isso quem acompanha Ney sabe, mas fica mais claro ainda em “Olho Nu”. A transgressão de Ney não tinha esquema, nunca teve, como ele mesmo disse aos 70, depois de ter sonhado com um. Quem não sonha? Um esquema para transgredir, ir além, fugir do trivial, da banalidade e da repetição triste que vivemos todos os dias.
Ney não teve o esquema, mas transgrediu ainda assim. Fez sua música, sua arte, criou personagens, defendeu a sua liberdade – a sexual, a de ser artista e a de cantar o que queria independente se o que cantava ofendia alguém.
Olho Nu não é animal como “Raul – O início, o fim e o meio”.  Não porque a genialidade de Ney seja menor que a de Raul; nem que a intensidade do baiano fosse superior à do sul-mato-grossense. O filme da vida de Raulzito tem mais emoção, talvez porque ele já esteja morto e não pode dar pitaco na película. Ney protagoniza a sua própria biografia. Por isso sua história nos parece mais suave, mais branda, menos rock’n roll que a de Raulzito.
Olhando além das duas narrativas – que são muito distintas – um ponto em comum é a força e a vontade de ir além do que nos é proposto pelo status quo. Há riscos. Sempre há. Raulzito se foi nessa, mas deixou sua obra que ainda é descoberta pelas gerações quase um quarto de século após sua partida. Ney está aí, como ele mesmo disse, escapou da leva de amigos que se foram nos anos 80 com a proliferação do vírus HIV, que ele suspeita ter sido criado pelo sistema como controle social.

Segundo ele, não teve esquema algum. Permanece aí, sendo motivo de inspiração. Organizado dentro do sistema, gravando discos e sendo divulgado, como tem que ser para que o trabalho funcione, mas sem deixar de criticar o que não concorda, gostando a banda (do governo ou quem mais estiver pela frente) ou não. Há poucos como ele. Assistir sua trajetória é um tapa na covardia – nossa e do mundo.