sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Não pense que a cabeça agüenta se você parar

São muitas as dívidas: falar sobre a O homem da tarja preta, entrevista com Leonardo (biólogo – sobre as células), André Poubel (teatro), mas hoje me dedico a outro fato:

Não pense que a cabeça agüenta se você parar

Ontem fez uma semana que acordamos com a notícia de que Leila Lopes havia falecido. A princípio, para mim, era uma mera notícia da morte de alguém da mídia. Não acompanhei o sucesso de Leila Lopes nas novelas. Assisti “O Rei do gado”, mas não me lembro dela. Sua última participação na Globo foi em 1997, em Malhação. E a última novela que fez foi Marcas da Paixão, em 2000, na Rede Record. Em 1997 eu não acompanhava Malhação e também não assisti Marcas da Paixão.

Para ser sincera, só fui saber da existência de Leila Lopes quando ela, ao iniciar no cinema pornô, virou figurinha fácil em revistas e sites de celebridades, especificamente nos que sacaneiam as mesmas. E como não me despertou muita curiosidade, fiquei achando que ela era só mais uma prestadora de serviços da indústria do sexo.

Quando li a matéria sobre a morte de Leila, algo me chamou a atenção: suspeita de suicídio.Tenho uma curiosidade particular sobre os suicidas. Certas horas me arrebato de admiração por esse seres que têm coragem de abandonar a vida. Em outros momentos acho que são os maiores covardes da humanidade, aqueles que sequer suportaram os percalços e que não seguiram no processo de resistência. Talvez seja um maniqueísmo chinfrim da minha parte, quando na verdade o que importa não é coragem ou covardia nos seus sentidos puros, e sim cada ser humano e o que o levou a abandonar o barco, ou melhor, a cansar de resistir.

Li a suposta carta que Leila escreveu antes de morrer:

"Não chorem, não sofram, eu estou ABSOLUTAMENTE FELIZ! Era tudo o que eu queria: ter paz eterna com meu Deus e, se possível, com minha mãe. Eu não me suicidei, eu parti para junto de Deus. Fiquem cientes que não bebo e não uso drogas, eu decidi que já fiz tudo que podia fazer nessa vida. Tive uma vida linda, conheci o mundo, vivi em cidades maravilhosas, tive uma família digna e conceituada em Esteio, brilhei na minha carreira, ganhei muito dinheiro e ajudei muita gente com ele. Realmente não soube administrá-lo e fui ludibriada por pessoas de má fé várias vezes, mas sempre renasci como uma fênix que sou e sempre fiquei bem de novo. Aliás, eu nunca me importei com o ter. Bom, tem muito mais sobre a minha vida, isso é só para verem como não sou covarde não, fui uma guerreira, mas cansei. É preciso coragem para deixar esta vida. Saibam todos que tiverem conhecimento desse documento que não estou desistindo da vida, estou em busca de Deus. Não é por falta de dinheiro, pois com o que tenho posso morar aqui, em Floripa ou no Sul. Mas acontece que eu não quero mais morar em lugar nenhum. Eu não quero envelhecer e sofrer. Eu vi minha mãe sofrer até a morte e não quero isso para mim. Eu quero paz! Estou cansada, cansada de cabeça! Não agüento mais pensar, pagar contas, resolver problemas... Vocês dirão: Todos vivem! Mas eu decidi que posso parar com isso, ser feliz, porque sei que Deus me perdoará e me aceitará como uma filha bondosa e generosa que sempre fui. (...)” Leila Lopes.

Para ler na íntegra, clique aqui

“Vendo a vida passar
E essa vida é uma atriz
Que corta o bem na raiz
E faz do mal cicatriz
Vai ver até que essa vida é morte
E a morte é
A vida que se quer”
Refém da Solidão – de Paulo César Pinheiro e Baden Powell


Leila foi clara: queria a paz. A paz só existe na morte. A pulsão quer se satisfazer, quer morrer. Desde Freud, o pai da psicanálise, aos compositores populares Paulo César Pinehiro e Baden Powell isso fica claro. “Vai ver até que essa vida é morte /E a morte é /A vida que se quer”. A forma de resistirmos à vida é nos complicando, ou seja, adquirindo significantes. Leila era atriz e também foi apresentadora. O ator, esse que vive dos holofotes não só dos palcos e dos sets de filmagens, mas dos holofotes midiáticos, se agarram a que? Pelo pouco que sei de Leila, pude perceber que ela vivia de sua imagem. Uma mulher muito bonita, atraente e que fez sucesso por muitos anos. Junta-se a beleza que já lhe foi dada sem nenhum esforço, com a pompa do sucesso, a vivência do glamour e o que sobra? Viveu apenas da imagem e do sucesso. Só que os dois acabam. Ela foi transparente: “Eu não quero envelhecer e sofrer”.

Todos pensavam que ela tinha 40 anos, quando em sua morte, soube que ela tinha, na realidade, 50. Lidar com o corpo em degradação é complexo para todo mundo, mesmo para os que a vaidade não é tão intensa. Quando começamos a perder elasticidade, quando temos que diminuir nosso ritmo porque não agüentamos correr, ou quando nos abaixamos e sentimos dor, tudo isso mostra escancaradamente as nossas limitações. Para quem vive da imagem, o envelhecimento deve ser um sofrimento desmedido. O sucesso também é efêmero, ainda mais quando se produz o comum, o que está na mídia e é facilmente substituído. O que não é singular, raramente é perene. Mas isso não é uma crítica a Leila. Cada um sabe do seu caminho, do seu processo. Imagino que ela tenha sofrido demasiadamente. Tanto que não soube lidar com isso e quis a paz, porque estava “cansada da cabeça”. Daí entra o Raul: “Não pense que a cabeça agüenta se você parar”. E é justamente isso. Qual era o significante que aparentemente sustentava Leila? Seu corpo, sua imagem que levavam ao sucesso. Na chegada da idade e na falta de sucesso a que se agarrar? Em alguns casos, as pessoas se agarram à família. O que também não é nada saudável, cá pra nós.

Mas Leila era órfã. E também não tinha filhos. A cabeça agüenta se você para? Raulzito dizia que não. Aliado a isso, há um agravante. Leila que por um momento longo fez parte da “elite das celebridades”, vide seus 10 anos de Rede Globo, passou para o “submundo”. Passou a fazer cinema pornô. Talvez porque não quisesse ficar sem trabalhar, porque precisasse da grana, ou porque teve vontade mesmo de experimentar, ora! Que mal há nisso? Mas o moralismo que nos habita – sim, em algum momento ele aparece em cada um de nós – vai contra isso. E a própria classe a qual ela um dia fez parte - e provavelmente tinha amigos – serviu de superego da moça. O autor de novelas, Walcyr Carrasco escreveu uma dura crítica a Leila em seu blog, em 2008, quando filme pornô “Pecados e Tentações” foi lançado. Depois da morte, declarou-se arrependido. É assim mesmo, às vezes falamos o que não devemos, apontamos coisas sem precisarmos apontar, mas a vida é assim.

Fico imaginando o quanto o superego dessa mulher deve ter feito pressão pra ela se matar. Porque por mais corajosa que ela tenha sido em fazer o filme (digo corajosa no sentido de ir contra o que sua classe pensava sobre o seu ato), ela não deve ter suportado as críticas.

Vejam, aqui não levanto bandeira da indústria pornográfica, mas também não sou contra. Não acho que esse deva ser o único significante de ninguém, vide o que aconteceu com a Leila e NOVAMENTE como afirmou Raul: “Não pense que a cabeça agüenta se você parar”. Agora, essa moralização é uma neurose sem mais tamanho, e que novamente digo, habita todos nós. Está entranhado em mim e é necessário dar um chute. Talvez a mortificação do superego aliado ao medo de envelhecer tenham matado Leila.

Além das promessas que deverão ser cumpridas, falarei de Raulzito, vejam o link abaixo:

http://www.youtube.com/user/DanielCruz886#p/u

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