quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

A despedida do seu Armando



Sigo eu na minha vida cigana, desta vez não por inquietude ou por aquele bicho carpinteiro que me habita, mas por questões contratuais. Foram seis meses no antigo endereço, um tempo muito bom eu diria. Gente é bacana, mas por ter crescido sem irmãos tenho apreço pelos hábitos solitários – principalmente em casa.

Passado isto, tudo bem. Nova casa, novos amigos. A correria da mudança foi tão grande que não tive o tempo de curtir a habitual dor da despedida dos cancerianos, de jogar papeis fora e relembrar os momentos naquele lugar. Foi assim, vapt vupt, como é a vida na metrópole. E aí, foi quando eu estava carregando a última bolsa para o caminhão que o seu Armando – que todos os dias de um jeito fofo, mais do que qualquer outro mortal que conheci nessa cidade, me perguntava se eu tinha pego o jornal que ele com todo o carinho colocava na minha porta – disse com os olhos cheios d´água que iria sentir a minha falta.

Quando eu não saía apressada, seu Armando (tão bom poder escrever seu, no jornalismo que faço ele tem que ser limado) ainda comentava uma notícia ou outra, perguntava se eu estava de plantão. Se eu saísse em outro horário que não o habitual com roupas leves (não as que uso para trabalhar) ele já dava uma dica para aproveitar o dia. “Hoje tem sol, dá para curtir a praia”. Dias antes de me mudar, descobri que ele é colecionador de vinis e que compra vitrolas por aí. Eu tinha acabado de ganhar uma e deixado na portaria pela falta de tempo para subir e colocar em casa; assim que me encontrou ele me perguntou se eu queria vendê-la.

Morei cinco anos em um apartamento antes desse. O porteiro que era meu amigo deixou o edifício alguns meses antes de eu ir embora. Foi uma despedida breve. Fiquei feliz. Nunca achei que em seis meses de pouca convivência eu poderia fazer falta a alguém. Também vou sentir falta da delicadeza do seu Armando. Difícil mesmo é encontrar tanta gentileza assim na vida cotidiana.

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