quarta-feira, 28 de março de 2012

Para ser pássaro

Imagem de Vicky Furtado*

Quando cabiam nos dedos a contagem dos meus anos, achava eu que os uniformes eram um ferimento à alma. Ser livre era poder vestir o que quisesse para ir à esquina ou à escola, sem distinção.

Duas mãos já não eram suficientes para dizer aos estranhos que me perguntavam qual era a minha idade cronológica.

Nesta época, liberdade era algo parecido como andar na rua, conhecer lugares, sem hora pra voltar pra casa.

Faltavam apenas alguns dedos para preencher as mãos e os pés. Aí, ganhar asas era algo como sair de casa, perceber o mundo com os meus próprios sentidos, sem influências familiares.

Ser pássaro passou, depois de algum tempo, poder dizer sim ou não de acordo com a minha vontade.

Depois descobri que o nível de passarinheirismo tinha mais a ver em saber dizer sim ou não na hora certa do que ir de acordo com a própria vontade.

E então ser livre era poder dar vazão ao que eu sentia da melhor maneira possível. Foi neste momento que descobri que para ser pássaro era preciso querer sê-lo todos os dias. E que, quase como num exercício de esteira - aquele em que corremos e não saímos do lugar - ser livre era um processo diário e incessante.

Nunca parava e nunca poderia deixar de querer ser.
Pensei: "como é difícil ter asas". Mas não desisti de tê-las.

*Essa e outras ilustrações, além de fotografias, podem ser vistas até o dia 30 de março de 2012 em Porto Alegre, no Espaço Cultural do Hospital São Lucas da Puc-RS

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